Eurico Gonçalves

Variações para a Mesma Paleta

Maio 17, 2007 - Jun. 16, 2007
CPS Sede

Uma exposição de serigrafias de Eurico Gonçalves terá lugar no Centro Português de Serigrafia (Rua dos Industriais, nº 6, 1200 Lisboa) de 17 de Maio a 16 de Junho, na proximidade da recente e grande retrospectiva da Sociedade Nacional de Belas Artes. A exposição retoma temas e imagens do início do seu percurso e permite uma reflexão sobre linhas de força da sua pintura. O assumir de uma poética da ingenuidade caracteriza a figuração do artista nos anos 50 em "Mercado Persa" e as "Flores de Domingo" de 1952, uma poética e nostálgica visão do amor (representada por uma serigrafia na actual mostra). Ecoar de um universo infantil e mágico, em "Os Pássaros" de 1950, igualmente presente numa versão serigráfica, o fascínio pelo onírico traduz a atracção por dados universais do imaginário, o diálogo das tradições do Ocidente e do Oriente, élan surreal da sua obra nascido com os desenhos e textos automáticos dos cadernos da juventude, igualmente representados. Território intensamente vivo das primeiras sensações amorosas, de um olhar que o real devolve carregado de sonhos. A partir dos anos sessenta a figuração simplifica-se aproximando-se de uma linguagem abstracta que nos desenhos irrompe verticalmente num ritmo orgânico, deixando no papel o rumo dos gestos em sinais estruturados pelas leis do acaso e de uma lógica do consciente e do inconsciente, da razão, da emoção e do sentimento. A escrita é expressão do corpo (lisível nos ritmos verticais) e do mundo, o círculo, emblema de totalidade é o seu símbolo, irradia uma força de sugestão, poética e está representado na actual mostra em composições serigráficas da série "Estou Vivo e Escrevo Sol" do final da década de 80 e início da de 90. As caligrafias de Eurico que desde os anos sessenta, permanecem uma constante na sua obra, revelam um interesse pela arte e o pensamento orientais comum à pintura norte-americana e à europeia de Hartung, Mathieu, Michaux e Degottex e revelam o esforço de traduzir uma realidade total além das barreiras da compreensão. Na série de trabalhos em versão para serigrafia intervencionados individualmente pelo pintor que os intitulou "Variações Para a Mesma Paleta" (uma sequência que decorre de uma outra: "Aquém e Além Deserto (2000-2006)), sobre fundos de cores suaves o fluxo dos sinais aflora de mais perto os mistérios, num dramatismo contido e exaltado. Signos do silêncio, abstractos, pousam sobre pautas invisíveis, horizontes de ordem e tranquilidade "onde se vislumbra um espaço de infinitude" (E.G.), sobrepondo-se em movimentos impulsivos, de registos gestuais. Nestas "caligrafias" rápidas, resposta imediata a um espaço construído pelas coloridas barras horizontais, nascem ritmos, formas inesperadas que se movimentam com o espanto e alegria de uma linguagem cósmica. Os grafismos ora minuciosos, ora lineares, ora impetuosos, imprevisíveis alargam-se, ligam-se e soltam-se com a força do gesto, contínuo ou sincopado, marcas que podem converter-se em sinais inventados no momento da execução. Neles se projectam a informação cultural, os hábitos e os ritos da civilização contemporânea, transfiguração do quotidiano, e também as energias ocultas do inconsciente, as poderosas forças de criação do imaginário. Profundidade, envolvência simbólica destes sinais, reverberação da surpresa, frescura, conhecimento e sonho, conhecimento do sonho. Maria João Fernandes